segunda-feira, 25 de maio de 2020

JOÃO, O CRIADOR DE ESTORIAS


João um dia estava em sua casa e completamente entediado com a tv e o celular, ele descobriu sua nova distração diante da janela da sala de estar em sua casa; ela dava de frente para a rua. Ele ficava observando quem passava na rua de paralelepípedos e imaginava seus nomes, histórias de vida... E se distraia bastante criando personagens diante do que via. Era uma rua movimentada com uma ladeira, na qual passava muita gente_ Ele mora perto de um mercado municipal ( este era um ponto turístico dali) em uma cidade no interior de Minas Gerais. Ele fez disso um hábito e sempre apareciam novas pessoas para ajudá-lo a usar sua criatividade.
Num desses dias passou uma mulher que aparentava uns quarenta anos, com alguns bobs no cabelo, blusa sem manga, bermuda, chinelos e cheia de sacolas nos braços, óculos de armação quadrada e escura ( ele lhe deu o nome de Adélia), descendo a rua da casa dele. Ele já imaginou aquela mulher levando os ingredientes para fazer um feijão tropeiro com torresmo, arroz branco soltinho, uma salada de alface e tomate para receber umas visitas para o jantar. Uma mulher que gostava de arrumar-se, pois viu um batom claro quando ela virou o rosto na sua direção de um modo sonhador, e suas unhas estavam pintadas de pink. Ele a imaginou vestindo um vestido floral midi de alças largas, cabelo liso após soltar os bobs e escová-lo.  Ela ficaria linda e perfumada com um batom vermelho escarlate nos lábios para celebrar seu próprio aniversário ou de um parente próximo. Ele a imaginou muito despachada, que ria alto, "ligada" no 220v pelo jeito apressado, mas cuidadoso ao descer a rua.
Ele criou outra possibilidade para aquela mulher:
Ela iria fazer uma feijoada para o almoço em família, mas a noite iria ao casamento de uma amiga ou outra festa só com o marido para curtirem o momento como casal, algo que eles não faziam a um bom tempo, deixando os filhos com um parente. "Adélia" tinha pintado as unhas, delineado as sobrancelhas e soltaria o cabelo mais tarde deixando-o liso e lindo; usaria um belo vestido longo verde claro; lábios num tom nude; com os olhos marcados e uma pele perfeita; saltos finos, afinal iria de carro.  Ela poderia ser uma mulher uma mulher agitada, ansiosa, entretanto tímida, discreta.
Para João existiam várias possibilidades para aquela mulher. Ela poderia ser uma dona de casa, mãe e esposa durante boa parte de sua vida, com filhos adolescentes; um marido que trabalha e quando chega a sua casa só quer deitar no sofá e assistir jornal, receber tudo nas mãos, pois sua única resposta é que está cansado, que trabalhou o dia todo; como se ela não tivesse feito nada.  Ela ali na sua frente aparentando cansaço, desamparo, porém ele sequer a nota.
Ou ela pode ser o tipo de mulher que trabalha o dia todo, assim como o marido, porém ele e os filhos participam das tarefas domésticas para não sobrecarregá-la. Eles ainda são um casal apaixonado, onde ele sabe quando ela está triste, ou feliz, angustiada... Enfim, ele a conhece profundamente e vice-versa.
Ou "Adélia" é como a maioria das mulheres modernas que tem dupla jornada. Ela trabalha fora, chega cansada em casa e não pode descansar porque precisa fazer janta e almoço pro dia seguinte; por roupa pra lavar; passar uma pilha de roupa a sua espera há dias; lavar louça; ensinar filho (a) tarefa da escola ou ajudá-lo (a) caso for algo difícil pra ele (a); ou brigar para abaixar o som; ou sair do celular, porque precisam estudar pra prova de amanhã; ou simplesmente para ficarem um tempo em família, conversarem. Ela mal senta no sofá para assistir sua novela ou programa de tv favorito e cai no sono de tão exausta; ou já vai pro quarto bem tarde depois de fazer tudo sozinha e desaba na cama com sua roupa de dormir surrada, deixando o marido na mão. Namorar só no fim de semana após uns copos de cerveja ou vinho pra relaxar, e olha lá quando ela não dá a desculpa que está com dor de cabeça apenas para conseguir descansar. "Adélia" não sente energia para fazer nada além de dormir.
Ele cria essas possibilidades e nos faz refletir sobre as escolhas que fazemos na vida, sobre comportamento e educação que damos aos filhos desde pequenos.
João passou a escrever as estórias que criava e publicou-as em um livro que fez um sucesso inesperado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentario é importante para mim..

DIA DIFÍCIL

 Hoje está tão difícil.  Só queria desaparecer, evaporar como fumaça, e parar de dar trabalho. E ao mesmo tempo eu me sinto tão egoísta.  Te...