sábado, 10 de outubro de 2020

Mundos de Wesley


MUNDOS DE WESLEY

 

Eu sou Wesley e moro em Manaus. Trabalho como qualquer um, mas quando preciso descansar a mente, esquecer dos problemas eu vou para a floresta. 

Eu sou filho e neto de índios, então meus avós me ensinaram a andar no meio daquelas árvores; daquela vegetação fechada e que quase não dá para ver a luz do sol; me ensinaram sobre ervas que curam, como usá-las e quais devo me manter longe; aprendi como me defender de animais e como sobreviver sozinho no meio da mata.

 Meus pais morreram de febre amarela  logo que chegamos à cidade. Foi muito difícil e tive que aprender a língua daquelas pessoas tão diferentes no idioma, cultura, pois só sabia a língua da tribo. Sofri muito e fui bastante discriminado até conseguir entrar naquele novo mundo para mim,  conseguir confiar e conquistar a confiança de um novo povo era um desafio. Era como se eu estivesse me preparando para o que viria.

Em um feriado prolongado decidi ir para a floresta ver meus avós, a tribo e passear na floresta. O pessoal da tribo, especialmente meus avós, o cacique e a curandeira ficaram muito felizes em me ver.

 Caminhando, me desviando dos galhos, cuidando para não ser picado por cobras, aranhas ou outros insetos eu adentrava a mata com a tranquilidade de quem conhecia tudo com a palma da mão, até encontrar uma árvore diferente, com tronco grosso, de um marrom acinzentado, folhas  de  um verde esmeralda e  bem pequenas, umas frutas vermelhas que lembravam uma maçã, e parecem ser tão suculentas que com a luz do sol cintilam e me seduzem para prová-las  co. Eu pego e dou uma mordida, é mesmo muito suculenta e de um sabor agridoce que me deixa em êxtase, a ponto de sair dali e "viajar" para outro mundo.

Um lugar em que tudo parece conto de fadas, com gnomos de orelhas grandes e pontudas construindo casas, elas eram todas coloridas; outros trabalhavam maravilhosos jardins plantando flores de todos os tipos, com tamanhos, cores diferentes e me mostravam como a diversidade é bonita. As mulheres ficavam com seus vestidos de camponesas sentadas a porta de suas casas e se abanando com leques enquanto conversavam entre si. Crianças brincavam felizes na rua, que mais parecia um calçadão, pois ali não havia outros meios de transporte além de caminhar. Era tudo tão em paz, mas havia tanta vida através das inúmeras cores. Não havia calçada, era tudo um piso dourado como ouro, tudo era impecavelmente limpos, bem cuidado. As vozes eram suaves, ninguém dava gargalhada alta ou gritava. Os animais passeavam livremente, os pássaros voavam com uma liberdade que eu não tinha visto, exceto na floresta. Eu me imaginei se conseguiria morar ali, tenho minhas dúvidas, aquilo logo me deixaria entediado. Será que tudo deveria ser daquele jeito e estávamos vivendo de maneira errada? Eu refleti sobre isso. Eu perguntei a uma senhora se eles não tinham problemas ali, pois tudo parecia tão perfeito. Ela me olhou com um sorriso acolhedor já sem dentes e disse que todos têm problema, mas eles se ajudavam e logo era resolvido. Eles não pareciam se estressar, ficar nervosos com nada.  Eu conversei com uns gnomos que trabalhavam e cantarolavam alegremente. 

Imaginava que tinha passado um longo tempo ali, mas quando de repente voltei a floresta  parecia que não tinha passado nem uma hora ali. E voltei para a tribo me sentindo diferente, como se eu fosse outra pessoa, porém no mesmo corpo de sempre.

No outro dia parecia que tudo se repetia, menos o local onde fui parar.

Eu chego a um castelo medieval, onde as roupas e fala das pessoas pareciam com os filmes que eu já tinha assistido; eu estava ali ou achava que estava. Era tudo muito real. Uma mulher de cabelo claro, olhos de uma cor lilás chega até mim e me pergunta o que faço ali, que o rei me procurava. Era como se eu já fizesse parte daquilo por anos, mas não conhecia ninguém. Eu a segui até o rei, ela também era uma súdita e me disse no caminho que se chamava Joana e a sua função no castelo era ver se os outros estavam fazendo tudo certo. O rei brigou comigo. "Onde estava?eu te procurei por toda manhã. Preciso que sele o meu cavalo. Quero dar um passeio." Pedi perdão pela ausência, e segui a procura de um cavalo que não sabia qual era. Joanna me mostrou o cavalo, embora ela parecesse estranhar de eu não ter reconhecido o bendito cavalo. Eu o selei e avisei ao rei que estava tudo pronto para seu passeio. 

Algum tempo depois...

Eu precisei vestir a armadura para enfrentar um monte de guerreiros adversários que resolveram invadir o reino. Confesso que um pavor tomou conta de mim, pois nunca havia lutado com ninguém ou usado espada;  muito menos fazendo parte de uma tropa de guerreiros medievais lutando pra proteger o reino. Eu não sabia montar direito, então acabei caindo e rolando pela pequena colina, e felizmente não cheguei a me machucar muito.  Assim que parei de descê-la, eu já me encontrava na floresta mais uma vez, mas a verdade era que eu queria ver Joana de novo. Agora não sei como voltar lá.

Passei dois dias sem comer a fruta e refleti muito sobre como eu voltaria àquele mundo e como trazê-la para a minha realidade. Eu estava dividido; e se eu a trouxer para cá, mas ela não gostar e quiser voltar para o mundo em que conhece?Como faço agora? Devo ir para lá e ficar para sempre?

Minha avò chegou a mim e perguntou o que estava acontecendo, pois eu estava mais centrado, menos ansioso, mais sorridente, gentil e prestativo. Eu fingi que estava ofendido, mas no fundo eu sabia que estava certa. Eu costumava ser egoísta e ansioso demais, muito sério. A verdade era que eu só esperava que fizessem tudo por mim e para mim, entretanto, o contrario nunca acontecia.

Eu desconversei e sai de perto.

Então voltei à floresta, mas eu não queria ir para outro mundo, só iria por a cabeça no lugar. Um longo tempo se passou e acabei adormecendo embaixo de uma árvore qualquer; quando dei por mim eu estava em um rancho com alguns cavalos de inúmeras raças diferentes. Eu me olhei assustado e pensando como tinha ido parar ali, já que não tinha comido a fruta. Um homem de barba me chamou pelo nome, como eu já trabalhasse ali e me pediu para colocar água, comida e para escovar os que estavam no estábulo. Eu entrei desconfiado, pois nunca tinha feito isso antes, e se me mordessem ou me dessem coice?Nenhum fez nada comigo e consegui cuidar deles. Um estava agitado e pedi ajuda, mas um dos homens que cuidava deles disse que o cavalo gosta de passear todos os dias naquele horário. Sai o puxando, no entanto o cara na hora que me viu disse: parece que nunca andou em um cavalo, deixa de ser medroso, sele e monte nele, cavalgue até ver que ele está cansando, e então volte. No começo foi difícil, eu nunca tinha montado e tive medo de cair, mas no meio do caminho eu já cavalgava como um bom cavaleiro. Eu senti um profundo orgulho de mim mesmo cavalgando daquela forma e passeamos muito. Voltamos, pois Wenk estava cansado, então o cobri com a manta para não se sujar; limpei o estábulo e fui tomar um banho, apareço de repente nu na floresta. E agora?Como chegarei assim na tribo? Minha vò me dará um grande sermão. Eu resolvi dormir no meio da floresta, porém esfriou demais, então peguei umas folhas de taioba e improvisei uma roupa. Felizmente quando cheguei lá todos já tinham ido dormir e descansar para o dia seguinte. Entrei na minha oca de palha, vesti uma roupa decente e dormi me perguntando o que estava acontecendo comigo. Uma viagem surreal, enigmática como todas as outras.

No dia seguinte eu voltei à floresta e lá eu fechei os olhos desejando muito encontrar Joana, eu pensei , será que funciona?E não funcionou; portanto, eu comi a fruta e fiquei muito feliz quando me deparei com Joana depois de poucos minutos. Eu queria puxá-la e levá-la embora dali comigo. Eu sentia que existia algo forte entre nós e não apenas atração. Eu e Jo conversávamos muito quando jà tínhamos feito nossos trabalhos e ela me contou sobre sua infância.

 Ela è filha de uma das súditas, Ana, a mais próxima da rainha, entretanto, a outra súdita que fingia ser amiga da mãe dela, e que no fundo sentia profunda inveja da proximidade daquela mulher com a rainha Mari; acabou roubando Joana e a levou para um casebre longe do reino, assim achariam que alguém de fora a tivesse roubado. Ela levava uma vida tranquila, sem sentimento algum de culpa. A mãe de Joana contou à rainha o que houve aos prantos. Mari mandou vasculhar todo o reino e a garotinha não foi encontrada. Ana ficou tão triste que adoeceu,visto que ela havia perdido o marido há pouco tempo por causa de um golpe de espada no peito e agora sua filha desapareceu. A pobre mulher ficava pensando o que tinha feito para merecer tanto sofrimento. No seu leito de morte, a sua falsa amiga disse-lhe próximo ao ouvido que ela havia roubado o bebê, e que Ana já tinha tudo sendo amiga da rainha, não precisava de filhos; ela sim merecia um filho que nunca poderia ter. Ela arregalou os olhos com a confissão e sem forcas para reagir faleceu sem marido e sem a filha.

Aquela megera ia ao casebre ver a menina já crescida e só deixava dois pedaços de pão e dois copos de água até o dia seguinte; no entanto, quando a menina era pequena ela a tratava como princesa e ensinou-lhe tudo que sabe hoje; enquanto isso a menina deveria deixar tudo limpo, além de costurar a roupa e fazer compotas com as frutas que trazia. Quando Joana já tinha idade suficiente para ir ao reino, ela inventou que a menina era sua sobrinha e que passaria a morar com ela, pois a mãe da garota tinha morrido. Aquela mulher a fez chamá-la agora de tia, não mais de mãe. Joana ficou confusa, mas obedeceu e sua vida continuou do mesmo jeito de antes, só que agora sua “tia” não teria que andar tanto para levar comida e água para ela às escondidas.

Quando Joana fez dezoito anos, sua “tia” contou-lhe toda a verdade, pois não lhe interessava continuar com aquela mentira; a menina havia se tornado uma pedra em seu caminho. O rei e a rainha já tinham morrido e agora quem reinava era o príncipe, o qual não conhecia a história. Desde então ela estava sozinha e precisava se virar para viver. Sua tia morreu de um mal súbito alguns dias depois que contou tudo para Joana. Aquela menina tinha um coração tão bondoso que ficou triste pela mulher, pois boa ou mà, ela que a havia criado todo aquele tempo.

Quando soube de tudo a minha vontade era colocá-la em meus braços e niná-la como se faz com um bebê; queria que se sentisse segura e em paz; mas não podia, eu então a abracei forte.  Sabia o que era se sentir sozinho, sem pai nem mãe; um garoto que precisou ser emancipado aos quinze anos, pois queria viver na cidade. E mesmo eu tendo meus avòs, nunca è a mesma coisa. Eu também lhe contei minha historia e nos abraçamos mais uma vez compartilhando a dor um do outro e chorando. Eu fiquei ainda mais apaixonado por aquela mulher e ela por mim.

Eu a chamei para ir embora dali e viver uma nova história:

_Joana, vem comigo, vamos viver nosso amor longe daqui, venha conhecer meu mundo.

Ela me olhou como se fosse louco, e até parecia que eu estava, mas eu a amava e a queria comigo.

Eu a beijei na esperança de que sumíssemos dali juntos, mas nada aconteceu. Os lábios mais delicados e suaves que já havia beijado.

Ela me afastou e me chamou de louco e disse que se eu realmente a amasse, que ficasse ali com ela.

Eu tentei varias vezes voltar para meu mundo e nada. Eu tinha uma vida fora daquele mundo em que eu me encontrava, mas mal sabia eu que se beijasse alguém de outro mundo ficaria por lá. Bateu um grande desespero mesmo estando ao lado do meu amor. E agora, como faço para sair daqui?Pensei, pensei e nenhuma idéia vinha.

No outro mundo sua avò percebeu que o neto havia sumido, ela tomou um chá revelador com suas ervas misteriosas para ter alguma revelação sobre o neto. Ela sentiu uma fraqueza tão grande que desfaleceu na hora. Como em um sonho ela via o neto em um castelo, com roupas estranhas e uma jovem loira, delicada e de olhos de cor lilás, ela os viu se beijando e ouviu uma voz profunda dizer-lhe: ele comeu uma fruta (mostrou a fruta vermelha), ele agora só sai de lá por seu intermédio. Você precisará fazer um feitiço contrário. Eu te direi o que deve fazer e cada socada no pilão que der para transformar tudo em pó, mais ele se afastará daquele mundo, só tem um problema; ele está apaixonado por aquela garota e ela não pode vir pra cá. Se ele decidir ficar lá, nunca mais conseguirá voltar, e se decidir voltar, nunca mais encontrará a garota. Agora acorde e faca o feitiço. Sua avò acordou e começou a pegar lascas do tronco da árvore da fruta mágica, sementes de frutas como tucumã, buriti, e também grãos. Ela pegou várias coisas e colocou no pilão, com o qual começou a socar, socar e socar.

Enquanto isso, no mundo estranho

Que estranho, estou sentindo que sou puxado por uma forca tão grande que não consigo descrever, ele pensou...  Sinto-me sendo puxado para trás. E Joana me perguntando aonde eu ia, se não a amava mais.

_Wesley, decida, você quer ficar comigo ou quer ir? Sinto você angustiado ficando aqui. Se for, nunca mais me procure.

Eu pensei rápido e decidi ir embora. Aquilo tudo não tinha a ver comigo, mesmo eu a amando.

_Espero que me perdoe meu amor. Eu sempre te amarei, mas não pertenço a este mundo.

Eu fui embora dali com lágrimas nos olhos. Ela virou de costas para mim, e percebi que chorava.

 E fui puxado para meu mundo de um modo abrupto. Cheguei fraco e no chão próximo da minha avò que me abraçou.

 _Você está de volta meu neto, que bom. Aqueles mundos estão com portões fechados para você agora.

Nunca mais eu voltei à floresta nem a ver a minha Jo. Agora è seguir minha vida. Foi uma estranha, mas indescritível aventura que me transformou em outro homem.

 

 

 

 

 

 

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