sexta-feira, 1 de março de 2019

LÍDIA

Era um dia nublado e todos na casa de Lídia estavam conversando de forma descontraída entre seus pais e parentes que foram fazer uma breve visita e buscá-la. Era um domingo preguiçoso após o almoço e a conversa corria sem pressa. De repente a chuva começa a cair de um jeito calmo e exalando no ar o cheiro de terra úmida. Lídia correu para vislumbrar a chuva pelo peitoril da janela do quarto que compartilhava com Luíza, sua irmã caçula, que no momento brincava de desenhar com os irmãos maiores. Ela ficava fascinada com a chuva caindo tranquilamente no gramado ( pensando que num futuro próximo aquelas gotas deixariam o gramado verde e florido) e no barulho que causava ao tocar no telhado; sem raios ou relâmpagos, trovões, que sempre acabavam por assustar Luiza e os irmãos gêmeos, Luca e Jordano, de seis anos, ruivos com pequenas sardas, assim como sua mãe.
Lídia estudava na cidade durante a semana, onde morava com os tios e nos fins de sexta-feira eles a levavam para a chácara onde sua família morava, uns cinquenta quilômetros da cidade. Lugar onde ela podia subir na mangueira para saborear uma suculenta manga rosa, ou catava as jabuticabas que caiam da jabuticabeira, enquanto sonhava com seu futuro marido, seu colega, Jonas, mas que sequer a notava devido tantas garotas chamarem sua atenção e ela ser tímida, vestir de um jeito mais simples e recatado. Um jeito ainda de menina, não de uma moça de quinze anos, como era.
Jonas é um rapaz que na primeira impressão se mostra um tanto presunçoso, convencido devido sua beleza e riqueza da família, mas quem o conhece de verdade sabe que ele é mais profundo e interessante e ela sente isso, apesar de nunca ter tido a mínima oportunidade de ter trocado uma palavra com ele. Ela sonha com seus diálogos mais profundos, discussões sobre assuntos em comum, almas compartilhadas, sorrisos e olhares que se encontram vez ou outra, dedos que se entrelaçam enquanto conversam e os corações batendo forte. Ela acreditava que eles eram feitos um para o outro, mas que Jonas ainda não a tinha reconhecido. Apesar de todos esses sonhos ou ilusões, a jovem nunca contara para ninguém, pois achava que ririam dos seus sentimentos e pensamentos. Ela não tinha amigos na escola, nem fora. Nos intervalos das aulas e dos afazeres na casa da tia, seu lazer eram os romances que pegava na biblioteca municipal. Ela ama ler e viajar nas histórias. Quando tem um tempo também gosta de escrever em seu diário, este que ela descrevia seus sentimentos mais puros e sinceros sobre Jonas, a família, a vida no geral. Eram sentimentos  muitas vezes de solidão e tristeza por não ter amigos; de dor, porque em certas horas nem ela acreditava que seu primeiro amor se tornaria realidade.
Na verdade, a maioria dos primeiros amores nunca se tornam realidade, só ficam na nossa lembrança como algo inocente e infantil. Uns dois anos atrás Lídia passeava pela rua sem rumo, apenas pensando na sua vida, no seu futuro, tão distraída que quase foi atropelada por uma moto, se não fosse a buzina despertá-la e fazê-la dar uns passos para trás ainda assustada com o coração quase para sair pela boca.
Ela voltou correndo para a casa dos tios e ficou o resto do dia quieta, ela contou para sua tia Marina, irmã de sua mãe o que aconteceu naquela tarde quando voltava da escola e Marina a repreendeu para ter cuidado e não ficar tão distraída, que seu futuro era ajudar sua mãe até o dia do casamento e ensinar aos filhos os deveres de casa, nada mais. _Pare de sonhar com bobeiras, garota! Assim que acabar os estudos eu te levo para morar com seus pais novamente, até que encontre um filho de algum vizinho da chácara de seus pais para casar.
A garota prometeu ter mais cuidado e pediu licença para voltar ao quarto e lá choramingava imaginando um futuro igual da mãe; muito cansativo e entediante, sem maiores expectativas.
Lídia queria estudar mais, queria namorar como qualquer moça da idade, mas queria viver, conhecer o mundo que a mãe nunca chegou a conhecer e não ser apenas uma  esposa com casa e filhos para cuidar. Era  um futuro limitado  demais para ela e não aceitaria isso.
No sábado seguinte ela conversou com a mãe e disse que pretende viajar para a capital quando terminar os estudos, que os ama muito, mas sonha um futuro diferente para ela, nesse ínterim ela até esqueceu de Jonas. Sua mãe ficou chocada, mas aceitou e disse que conversaria com seu Roberto, pai de Lídia, e depois lhe dariam um parecer. A jovem ficou ansiosa o resto do fim de semana e durante a semana inteira, a ponto de não conseguir se concentrar nas aulas, embora seja ótima aluna.
No sábado seguinte seus pais lhe deram a aprovação e ela prometeu-lhes não decepcioná-los enquanto estivesse fora. Ela já estava com saudade, com medo e muita alegria pela perspectiva de sua nova vida no próximo ano.
Ela viveu o resto do ano com dedicação aos estudos, apreensão pelo que viveria e saudade da família, dos pomares, da chuva caindo no telhado...

Próximo ano...

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Seu comentario é importante para mim..

DIA DIFÍCIL

 Hoje está tão difícil.  Só queria desaparecer, evaporar como fumaça, e parar de dar trabalho. E ao mesmo tempo eu me sinto tão egoísta.  Te...